Conversávamos sobre a vida e sobre o começar de novo. Perguntava-lhe por que não foi actor mais cedo? Porquê só aos 68 anos, quando chegou à reforma? A justificação era simples: "Tinha mulher e filhos." Franzia o sobrolho enquanto o dizia, como se lhe tivesse falado de uma proposta louca. Além dos filhos e da mulher, tinha contas para pagar. Claro. Nunca lhe passou pela cabeça atirar tudo ao ar e seguir um sonho. "O meu filho agora quer ser actor. Estou muito preocupado. É tudo tão instável. Vocês agora é que têm a mania de serem felizes", disse enquanto gesticulava e atirava a mão na minha direcção em sinal de desdém. Mania de ser feliz... Parecia que falava de um luxo, como a mania de ter coisas da Apple ou de conduzir carros novos. Naquele tempo não se pensava em ser fotógrafo ou actor para se ser feliz. Pensava-se numa profissão e no dinheiro que ela dava. O ser feliz era um brinde. Uma extra. Não uma motivação.
Ao falar com outra colega dele, uma velhinha também ela recém-actriz, ela dizia-me: "Sabe, fui convidada pela Amélia Rey Colaço para fazer parte da companhia dela, mas o meu marido pediu-me para não ir. Como ele tinha sido tão bom para mim, não fui." Outro conceito novo. Como ele até fez o favor de ser bom para ela, ela não foi. Ficou. Recusou um sonho, perfeitamente compatível com uma vida a dois. Mas ele tinha sido tão bom...
Gerações diferentes ou planetas diferentes dos nossos?
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